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Ciclismo – Murilo Fischer do Brasil

O maior ciclista da nossa história completa 37 anos de idade. E à toda! Com um fôlego, com uma motivação, com uma “grinta” (como eles dizem na Itália), que indicam que Murilo continuará na ativa ainda por um bom tempo.

por Sidney Silva
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A edição desta matéria é uma homenagem ao esportista brusquense mais ilustre de toda a história, onde estou copiando a matéria escrita por Fernando Blanco. Para os apaixonados por Esporte, vale a pena ler e conhecer quem é o ciclista Murilo Antônio Fischer, filho do Sr. Egídio e da Dona Goreti.

NO DIA DO SEU ANIVERSÁRIO, A HOMENAGEM DE CICLISMO PRO

Por Fernando Blanco

Dia 16-06-2016, um dia muito especial para o ciclismo brasileiro: o maior ciclista da nossa história completa 37 anos de idade. E à toda! Com um fôlego, com uma motivação, com uma “grinta” (como eles dizem na Itália), que indicam que Murilo continuará na ativa ainda por um bom tempo.

O nosso campeão, catarinense de Brusque, poderia ser destaque pelo simples fato de ter nascido num país com pouca tradição no ciclismo. Um desavisado do COB ou do Ministério dos Esportes, por exemplo. Mas isso está longe de ser o caso. Murilo tem uma legião de fãs por aqui, mas poucos de nós o vimos correr no Brasil, afinal ele foi correr e vencer na Europa ainda muito jovem e a internet engatinhava ainda.

Outro ponto importante: nós os admiramos mas, de fato, pouco ou nada entendemos como funciona o pelotão que ele corre. O ciclismo World Tour é outro esporte, não é esse ciclismo que conhecemos. Ou seja, nós admiramos algo que não entendemos direito.

Mas aí é que vem o fato que mais me encanta no Murilo Fischer: ele é ADMIRADO e RESPEITADO demais pelos homens mais importantes do ciclismo de verdade, do World Tour.

E por que isso? Pelas vitórias? Apenas parcialmente. Murilo venceu bem e belíssimas corridas. Mais pra baixo eu destacarei suas vitórias. Agora eu quero destacar as outras coisas que mais contam para o seu prestígio internacional:

1. Ele SABE CORRER DE BICICLETA (mais do que a imensa maioria daqueles todos craques que vemos no World Tour). Um exemplo: ele corre pela FDJ, cujo diretor geral é Marc Madiot, ex-campeão nas estradas (duas vitórias na Paris-Roubaix) e um sujeito dificílimo. Eu conheço bem a filosofia de Madiot: se ele pudesse, teria apenas garotos franceses em sua equipe. Mas ele precisa alguém para “cuidar”, para “pilotar”, seus garotos dentro do pelotão. E ele foi buscar um veterano … brasileiro.

Outro exemplo: quando Murilo foi correr para a Garmin eu destaquei: o dono da equipe, Jonathan Vaughters, é uma das melhores cabeças do ciclismo mundial. E ele escolheu Murilo para ser o homem-chave do trem de Tyler Farrar, o sprinter líder.

2. Murilo tem uma ÉTICA PROFISSIONAL impecável. O homem treina, mas treina muito, e em terreno duro no Passo Pordoi. E ele quer correr sempre. Na idade dele, e com tanto prestígio, poderia pegar mais leve mas parece um menino quando chega a fria e chuvosa temporada dos pavés. Após tantas temporadas ele continua querendo chacoalhar o esqueleto nas duras estradas da França e Bélgica, sempre a serviço do seu líder.

3. O homem é VERSÁTIL. Já o vimos ser o gregário das primeiras horas, já o vimos embalar o sprinter, já o vimos em fugas matinais. E já o vimos vencer bonito, antes de optar por ser domestique.

4. Murilo é GENTE BOA. Ora, o que isso tem a ver com o esporte? Muito. Ser competente na competição e ser bom de relações humanas são competências essenciais para o sucesso em qualquer atividade. E ele sabe ser querido no meio.

Para reforçar os pontos acima, eu publico abaixo três fotos que o próprio Murilo me enviou ao longo do tempo.

CAMISA TRICOLOR do seu líder Arnaud Démare, autografada para o Murilo. É o maillot que o sprinter francês usou na vitoriosa jornada na Milano-San Remo. O nosso campeão estava fora de combate, doente, e seu líder foi homenageá-lo. Oras, um líder só faz um agrado desses para alguém que considere muito especial.

FAZENDO SEAN KELLY GARGALHAR é uma tarefa para poucos. O irlandês, monstro sagrado da história do ciclismo, se profissionalizou em 1977 e desde então eu acompanho sua trajetória. Há anos que brilha como comentarista da Eurosport. Pois bem, há quase 40 anos que eu ouço e leio que Kelly é “taciturno”, de poucos sorrisos, mas com Murilo a coisa foi diferente. Poucos no pelotão teriam este poder sobre Kelly.

TREINANDO LADO A LADO COM NIBALI é algo que poucos ciclistas no pelotão atual poderiam se dar ao luxo. Acontece que o Tubarão de Messina respeita e não esquece o trabalho do então gregário brasileiro, mais experiente, que lhe deu grande ajuda no Giro 2007, quando corriam pela lendária Liquigas. Esta foto é de ontem: Murilo treinando perto de casa e o Maglia Rosa fazendo um “camp” na região de Treviso.

Entendam, eu estou numa idade que admiro grandes campeões das estradas, mas só respeito mesmo os campeões da vida. E Murilo Fischer venceu na vida. Como qualquer brasileiro amante do ciclismo, ele começou a pedalar com a estrada esburacada e o vento soprando contra. Tudo joga contra. Persistir no ciclismo é coisa para gente com uma força de vontade acima do normal.

Fazer sucesso no Brasil já é para alguém com uma resiliência anormal, com uma força mental diferenciada. Mas vencer na Europa e durante 13 temporadas – até agora! – é algo simplesmente espetacular. E muito difícil de se entender como isso é possível. É muito sofrimento (aos olhos do cidadão comum, como nós). E sempre ressaltando que ele venceu no “traguardo” e venceu no coração do pelotão.

MURILO NA ESTRADA – esta é a primeira vez que escrevo uma matéria sobre o Murilo Fischer. Atrasado talvez. Como ele está na ativa eu acabo deixando para depois, mas a data do aniversário dele me motivou a encerrar este jejum.

Olhem só, ainda garoto ele já batia os melhores e mais experientes do Brasil: em 1999 levou Torneio de Verão, que na época reunia a elite da elite, e em 2000 venceu a 9 de Julho.

Em 2003, ainda amador, foi Campeão Mundial B. O que é isso? Foi uma época em que a UCI limitava o número de nações que largavam no Mundial e por isso foi criada uma segunda prova, em outra data e local. O Brasil, que não tinha nenhum profissional na época, ficou no grupo B e venceu com Murilo. Foi um grande feito.

Eu vi o “Maillot Arc-en-ciel” dele autografado e enquadrado na Della Bikes, loja do grande campeão do passado Milton Carlos Della Giustina, que o treinava na época. Vale a visita lá em Floripa. Eu era fã do Milton quando comecei a correr e hoje tenho a sua amizade.

Em 2004 o nosso campeão mundial se profissionalizou pela equipe italiana Domina Vacanze, cujo líder era um certo Mario Cipollini. O velocista Murilo Fischer não poderia ter um professor melhor. E o seu début profissional não passou em branco: 6º na Geral do Tour Down Under e 2º numa etapa do Tour de Suisse não é para qualquer um.

Veio 2005 e Murilo optou por correr pela Naturino-Sappore di Mare, uma pouco conhecida equipe Continental. Tendo a chance de correr como líder o catarinense venceu como tal. Eu já escrevi aqui e nunca me cansarei de repetir – até porque muito poucos aqui no Brasil sabem disso: é dele a maior vitória em corrida de um dia da história do nosso ciclismo.

Ao vencer a centenária semi-clássica Giro del Piemonte o brasileiro entrou para o “albo d’oro” ao lado de … anotem aí: Gino Bartali, Alfrendo Binda, Fiorenzo Magni, Learco Guerra, Costante Girardengo, Felice Gimondi, Francesco Moser, Gianni Bugno, Franco Ballerini e Andre Taffi – um verdadeiro festival de “campionissimi” do ciclismo italiano. Dos gigantes da história acho que apenas Coppi, Saronni e Nibali não estão aí.

Entre os grandes estrangeiros, venceram no Piemonte, junto com o Murilo, os belgas Eddy Merckx, Roger de Vlaeminck e Philippe Gilbert. Fala sério, é demais, não é?

Mas naquele ano de 2005 o campeão brasileiro venceu outras belíssimas corridas em solo italiano: GP Bruno Beghelli, Memorial Cimurri, o tradicional GP Industria e Commercio di Prato, entre outras. Mas Murilo Fischer também fez alguns pódios que valem mais do que vitórias.

Que tal ser 5º colocado no Campeonato Mundial de Madrid? O circuito, todos diziam na época, seria fácil demais e terminaria num sprint de pelotão. Que nada, foi seletivo e o grupo rachou: o maior sprinter da época, Alessandro Petacchi, favoritíssimo, ficou no segundo grupo. A vitória ficou para Tom Boonen e um jovem espanhol de nome Alejandro Valverde ficou com a Prata. Lindo de ver o brasileiro tão alto na hierarquia da elite do nosso esporte.

Murilo foi também 2º no Giro del Lazio e 3º na Coppa Bernocchi e 4º na Coppa Sabbatini, todas semi-clássicas italianas. Para arrematar tudo isso, ele venceu o UCI Europa Tour. Simplesmente fantástico.

Em 2007, Fischer foi para a fortíssima Liquigas – onde já havia corrido outro gigante do nosso ciclismo, o paranaense Luciano Pagliarini. Neste mesmo ano Murilo correu o seu primeiro Tour de France e esteve pertinho de vencer a 11ª. etapa.

Após uma queda coletiva no sprint, Murilo estava bem colocado e seguiu em frente, sendo batido em cima da linha. Lembro-me de assistir ao vivo, pela TV, e pular no sofá de tanto que torci para ver o feito de Mauro Ribeiro – outro monstro do nosso esporte – se repetir.

Aos poucos o nosso Murilo foi migrando para a missão de apoiar outros líderes, mas ainda assim venceu algumas belas provas (forradas de grandes nomes do pelotão): etapa do Tour da Polônia (2007, vitória World Tour), semi-clássica Giro della Romagna (2009), etapa da Vuelta a Mallorca (2011, batendo o tricampeão mundial Oscar Freire).

E ainda achou tempo para voar para o Brasil e ser bicampeão brasileiro – em 2010 e 2011. Era bom demais ver o Maillot de campeão brasileiro em destaque nas principais corridas do mundo. Isso vai demorar para se repetir …

CORRIDAS GIGANTES – o Murilo é o único brasileiro a ter concluído os três Grand Tours. Ele tem na bagagem a incrível marca de ter concluído 5 vezes o Giro d’Italia, 3 vezes o Tour de France e uma Vuelta a España (ano passado).

E como fomos informados recentemente, ele estará nos Jogos Olímpicos Rio 2016: sua 5ª Olímpiada! Fenômeno. Menos pelas convocações em si, pois infelizmente neste período tivemos pouquíssimos ciclistas capazes de ameaçar a sua hegemonia, mas destaco seus 20 anos no alto da hierarquia do esporte.

Em quantas profissões (técnicas, acadêmicas, liberais ou executivas) alguém consegue se manter lá em cima, o tempo todo, enfrentando e superando a imensa pressão que advém da posição de liderança? Sou do ramo e posso dizer: quase ninguém!

CONCLUINDO, eu poderia escrever muito mais sobre este ícone do nosso ciclismo, do homem que se tornou lenda viva. Mas eu quero mais é ler a opinião de vocês e que todos desejem a ele um FELIZ ANIVERSÁRIO !!

E que em 2017 o Murilo reencontre o Vincenzo Nibali na nova equipe que vem por aí, aquela do Príncipe do Bahrein.

OBRIGADO POR TUDO E QUE VENHAM MAIS GRANDES MOMENTOS, MURILO !!